quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

I me mine (II)

OK, para não deixar o post anterior desacompanhado, resolvi desenterrar esta entrevista que dei para umas gurias muito simpáticas do site http://www.fotosefatos.jor.br/ , a fotografa Prisila Farias e a jornalista Lálika Stadnik. O texto é de março do ano passado, mas... antes tarde do que nunca, né?


23/03/2007

Entrevista com Simon Taylor

Charge com atitude e comportamento

- Entrem gurias!

A voz que saía do interfone era acolhedora. Eu e a Priscila Farias, minha amiga fotógrafa nos olhamos e um misto de vários sentimentos passou pelo nosso semblante. Será que Simon Taylor é legal? Simpático? Engraçado?

Minutos antes, dentro do Inter II, eu e Priscila íamos matutando como seria a entrevista, até que o ônibus nos avisou para descermos.

Depois que pulamos, a aventura foi achar a casa. O calor e a subida se tornaram inimigos. Mesmo assim, a Rua Teffé quase não parecia Curitiba. Tranquila, casas bonitas, cenário de cidade do interior, quase nos fez acreditar que tinhamos sido transportadas para outra cidade. Quase não acreditamos que estavámos na famosa rua dos calçados de Curitiba.

A expectativa de entrevistar Simon Taylor era grande, afinal ele é um dos maiores chargistas do Paraná. Não foi a toa que conquistou quatro prêmios Sangue Bom na última premiação. Três na categoria Charge/Ilustração e um na categoria página Diagramada. O prêmio é um reconhecimento do Sindicato dos Jornalistas do Paraná aos profissinais atuantes.

Simon iniciou sua carreira em 1996 ano quando se tornou ilustrador do jornal “Folha da Imprensa”. No ano seguinte, 1997, foi trabalhar no Hora H onde permaneceu por 10 anos, entre idas e vindas. Em 2002 foi chargista do jornal “A Cidade” e da “Agência de Notícias Cone Sul”. Em 2005 foi selecionado para um trainee em jornalismo gráfico na Folha de S. Paulo. Apenas 10 de 600 candidatos foram aceitos no programa. Passou por três meses de treinamento. Também já participou de Salões de Humor (Pernambuco, Porto de Galinhas e Rio de Janeiro) além de exposições individuais na Gibiteca de Curitiba, SESC/Centro e Museu de Arte Contemporânea do Paraná. E ainda expõe suas charges na internet, no site Charge On Line um dos maiores do Brasil. E como não poderia deixar de ser é apaixonado pela música. É baixista e guitarrista. Toca em bandas desde os 13 anos.

Parecia que nos conhecíamos há tempos. Logo nos levou para seu escritório onde nos contou como é a vida de um chargista em Curitiba.

Como e quando você começou a desenhar?
Não me lembro de não ter desenhado. Parece que nasci segurando um lápis. Desde sempre eu acho. Minha mãe guarda meus desenhos até hoje. Ela tem uma caixa cheia de papéis com os meus primeiros desenhos.

Qual a influência dos os outros chargistas em seu trabalho?
Quando eu tinha 12 anos meu tio me deu um livro do Henfil. Quando eu olhei eu gostei na hora. Pensei “o cara é demais!”. Eu não gosto só da arte, gosto do artista. Tem artistas que eu gosto mais de saber sobre a vida do que sobre o trabalho. Dos que estão em atividade o Angeli ganha em disparado. Ele é o melhor. Acho que o Angeli já transcedeu essa coisa de chargista. Ele está num patamar acima. É um traço de uma particularidade muita artística, desenho dele tem muita personalidade. Mesmo que você esteja bêbado jogado em uma esquina e voa um pedaço de jornal velho dá pra reconhecer o desenho do Angeli. Mas por incrível que pareça eu cresci lendo quadrinhos de super herói. Foi o que me fez desenhar num primeiro momento. Então eu tenho uma influência muito grande dessa época de super heróis, como o Frank Miller. Acho que os quadrinhos podem ser classificados com o antes e depois do Frank Miller. Agora de chargistas nossos tem um monte que eu gosto, o Jean da Folha de S. Paulo. O Laerte é genial também, não faz nada político mas são cartoons excelentes. Eu gosto das charges que passem alguma coisa, que tenham atitude e comportamento.

Falando um pouco sobre o caráter humorístico da charge. Você acha que toda a charge tem que ser obrigatoriamente engraçada?
Eu não consigo imaginar um chargista ou humorista que faz charge que não quer que as pessoas achem graça. Acontece que o humor é uma coisa muito subjetiva. O que é engraçado pra mim não é necessariamente engraçado pra você. Mas eu acho que uma charge, antes do humor, tem que causar alguma coisa, porque a charge politíca ou a charge editorial é um desenho vivo, completo, ela não apóia num texto ou está sendo apoiada. Tem começo, meio e fim e quer te dizer algo. Isso é essencial. A charge tem que dizer algo por mais idiota que possa aparecer. A charge pra mim é uma coisa muito completa e rica, não é a toa que eles põe charges em questões no vestibular para interpretação. Uma charge bem feita pode ter milhões de significados.

Sobre suas charges politícas. Algum dia você recebeu algum tipo de represália de alguém?
Pessoalmente não. Acredite se quiser. Nós vivemos tempos tão bundões que hoje em dia é mais fácil ser processado por uma charge esportiva do que por uma charge politíca. Há 30 anos atrás, se você fizesse uma charge dizendo que deputado tal era corrupto ou suspeito de ganhar dinheiro ilicíto de alguma obra superfaturada você ia preso. Mas hoje em dia, veja essa mudança de ministério do governo. O Presidente está há quatro meses mudando aquilo, já virou uma coisa escancarada. Teve um tipo de charge que eu fiz no Hora H há uns dois anos atrás que eram imagens computadorizadas. Elas causaram bastante polêmica, mesmo não sendo feita com traços, a charge não precisa ser necessariamente desenhada, traçada. Essas charges eu sei que causavam muita repercussão. Nessa última eleição, o Osmar Dias entrou com uns 14 ou 15 processos contra o Hora H. Não me processou pessoalmente como chargista mas o jornal e o site. Ainda não tenho essa alegria de político ligar pra mim e ameaçar de morte. Infelizmente.

Você acha que há uma autocensura no seu trabalho?
Não é exatamente uma censura. É que não existe jornal politicamente correto ou incorreto. O que exite é um jornal pago por um lado ou pago por outro. Não é uma coisa ilegal isso é imoral. Você infelizmente depende disso. O dono do jornal ganha rios de dinheiro mas em compensação emprega um monte de gente. Eu me lembro quando eu tinha 12 anos, eu fui vizitar o Paixão e eu perguntei porque ele não fazia charges com os políticos do Paraná. Ele me respondeu: “Se eu fizesse charge com o pessoal daqui eu ia ter que ficar puxando o saco do pessoal, então eu prefiro não me envolver”. E anos depois isso aconteceu comigo. Eu trabalhava no Hora H, um jornal que é declaradamente apoiador do Requião. Se eu trabalhasse na Gazeta do Povo seria ao contrário, eles apoiam o Osmar Dias. O que muda de um pra outro? Um é mais decente que o outro? Eu não acho. O Hora H é menor, a Gazeta tem uma equipe maior e um compromisso com o chamado “jornalismo sério”. Eu não acho que exista um jornalismo imparcial. O meu espaço de charge é sagrado no jornal. Nunca entrou nenhuma idéia que eu não concordasse.

E projetos para o futuro?
Na verdade tenho 1002 projetos na minha cabeça maluca. Eu tenho muitas idéias boas mas falta o comercial. Como fazer para viabilizar porque tudo é caro. Por isso que a internet veio para revolucionar, mas ao mesmo tempo se o projeto passou pelo percalço financeiro, é impresso ele tem mais credibilidade. E na internet entra de tudo, desde o bom até o ruim.

TEXTO: LÁLIKA STADNIK
FOTO: PRISCILA FARIAS

Nenhum comentário: